Fé X Razão: o pior conflito entre espíritas franceses e brasileiros
Não devemos iludir com o mel das palavras e com o dócil aparato das imagens.
O Espiritismo original, francês, e o Espiritismo brasileiro possuem sua maior e conflituosa divergência.
É aquela entre a Fé e a Razão.
Na aparência, tudo parece igual, visto na superfície.
Allan Kardec defendendo a Razão, mas reconhecendo o valor da Fé.
Por outro lado, Francisco Cândido Xavier, o Chico Xavier, defendendo a Fé, mas, em tese, reconhecendo o valor da Razão.
Na aparência, tudo parece caminhar para o mais saudável equilíbrio.
Mas não é isso que acontece.
O Brasil é um país com a maioria do povo desinformada de muitas coisas e, portanto, vulnerável às armadilhas fáceis do discurso mistificador das religiões.
O Brasil é o único país no qual o "bombardeio de amor" (do inglês love bombing) é visto por um grande número de pessoas como uma coisa boa.
Tem até o idiota da Internet, dizendo: "Se houvesse mais bombardeio de amor, na moral, galera, o mundo estaria vivendo na paz e na solidariedade".
No entanto, o "bombardeio de amor" é uma estratégia das mais perigosas e traiçoeiras da manipulação da mente humana.
Ele consiste em pretensos apelos intensos de afetividade e beleza profunda, feitos para desnortear até mesmo pessoas com algum ceticismo e senso apurado de desconfiança.
O "bombardeio de amor", que teve em Chico Xavier seu mais perigoso manipulador, é uma armadilha dirigida para mentes difíceis de serem dominadas pelo processos normais de manipulação.
E o surpreendente e, por isso mesmo, preocupante êxito do "bombardeio de amor" de Chico Xavier revela uma gravíssima divergência irreconciliável com o Espiritismo francês.
Essa divergência é o conflito entre Fé e Razão.
Aparentemente, supõe-se um equilíbrio entre os dois entes nos dois Espiritismos.
Mas a verdade é que o que há é um conflito, pois, se mergulharmos nas profundezas do que há por trás do discurso aparente, veremos o quanto Chico Xavier contrariou Allan Kardec.
Kardec sempre defendeu que a Fé deveria passar pelo crivo da Razão, processo sem o qual resultaria numa "fé cega" e desprovida de lógica e bom senso.
Em contrapartida, Xavier defendeu que a Razão deveria se submeter à Fé e não interferir nos seus dogmas, caso contrário haveria o "tóxico do intelectualismo" e uma "sabedoria inferior".
O francês defendia o rigor na defesa da lógica, o exame apurado, o questionamento crítico, a recusa de ideias truncadas e mistificadoras.
O brasileiro, ao contrário, defendia que a lógica cedesse sempre à crença religiosa, pois se não fosse assim a lógica seria maledicente, impiedosa e cruel.
São visões que não se batem e que estão por trás dos enunciados que sugerem um falso equilíbrio.
É um grave conflito que acontece sob um mesmo nome, Espiritismo, e os brasileiros têm muito medo de admitir, quando são convidados a tamanha tarefa.
Infelizmente, os brasileiros preferem sonhar, ficar no mundo da fantasia, embora finjam serem amigas da Sabedoria e da Verdade.
Mas preferem a aventura fácil da Mentira, da Mistificação, e, por isso, preferem o mundo de sonhos e fantasias desse Peter Pan da religiosidade que se tornou Chico Xavier.
Ainda que corram o risco de caírem nas nuvens de tanto sonharem, preferem as dores dessa queda do que a dor, mais leve, da desilusão com os dogmas, os ídolos e paixões religiosas.
É por isso que o Brasil está nessa situação caótica em que se vive. Os "olhos do coração" cegam.
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