Missivista fala do medo dos assassinos da própria morte

Um missivista, Eduardo José Matheus Ribeiro dos Anjos, de São Paulo, comentou a respeito da tragédia dos assassinos, não só dos feminicidas:

"Olá, amigos!

Sei que é muito espinhoso o tema da morte dos assassinos, porque nossa tradição moralista renega a tragédia a quem tira a vida de outrem, apostando no prolongamento da encarnação para supostamente limpar a barra do criminoso desse porte.

Vemos que nossa imprensa, capaz de noticiar males súbitos que matam gandulas de futebol de várzea, não darem uma única nota sobre o feminicida de décadas atrás que acabou de morrer de câncer aos 50 e tantos anos.

Isso é uma coisa estranha, e muitos desconfiam se essa ocultação da tragédia não seria para evitar botar medo no agressor que quer exterminar alguém, seja uma namorada que gritou com ele ou seja um negro ou LGBT que hoje é alvo de fascistas.

Ignoramos que os assassinos são os que primeiro mais estão ameaçados de sofrer tragédias não raro prematuras. Eles são os que mais correm risco de infarto fulminante, de câncer ou desastre de trânsito, pelas pressões emocionais e psicológicas que recebem.

Vejam o feminicida, por exemplo. Se ele sai da cadeia, ele fica patrulhando a mídia, evitando publicar reportagens que o desqualifiquem, documentários e cinebiografias sobre o crime que cometeu.

Isso não é uma questão de proteger a privacidade, apenas. É, portanto, um meio de evitar que eles sejam surpreendidos por alguma notícia ou comentário e morram de infarto com isso.

Os homicidas variam, em expectativa de vida, entre 60% e 80% em relação ao cidadão comum no Brasil. Se um assassino chega aos 85, 95 anos, ele corresponde ao brasileiro comum que chega aos 115 anos de idade.

Não é o ódio da sociedade que faz, por si só, o homicida morrer, muitas vezes com relativa prematuridade. Ele morre porque vive, dentro dele, pressões psicológicas comuns, podendo ser contraditórias, alternando entre a raiva e a depressão, o orgulho do crime cometido e a vergonha pelo mesmo ato, e sua situação de vulnerabilidade ante a sociedade.

Os homicidas são tão vulneráveis que só a sorte não fez, por exemplo, grupos de extermínio e jagunços morrerem em acidentes de trânsito, porque muitos deses grupos usam automóveis velhos e sucateados, e fogem em altíssima velocidade depois que realizam um assassinato ou chacina.

Os assassinos têm medo da morte porque acham que não haverá tempo para 'limpar o nome' sujo do sangue dos outros. Se sentem ofendidos só quando alguém lhes aponta uma doença. Um homicida se preocupa mais em processar um médico, quando este lhe anuncia um câncer, e até o assassino se dar conta da doença grave que o atinge, será tarde demais.

O que temos que fazer é orar para os homicidas e não nos iludirmos que eles ficarão entre nós durante muito tempo. Homicidas famosos podem morrer hoje mesmo, e o que nos resta é, sem ódio, orarmos por eles nessa situação difícil e ver que, ao morrerem, talvez não tenham perdido muita coisa, a não ser a ilusão de seus status sociais, ainda que como capangas de fazendeiros, por exemplo.

O que eles perdem é o invólucro de suas posições sociais, e talvez um homicida, morrendo cedo, seja mais proveitoso do que prolongar demais uma encarnação na qual poucos estão preparados para o verdadeiro remorso, e cuja longevidade só serve para blindar a vaidade e o orgulho de seus nomes ilustres ou semi-ilustres.

Por isso, cabe a nós orarmos pelos assassinos quando a sombra da tragédia, motivadas pelos abusos e excessos cometidos pelos próprios criminosos, bater à sua porta. Não será o moralismo nem o sensacionalismo criminal que fará as pessoas se apegarem aos próprios homicidas, ao mesmo tempo 'repugnantes' e 'exóticos'. 

As tragédias dos homicidas são uma realidade que ainda renderá muita notícia dada a contragosto pela mídia conservadora, mas que se deve ao fato de que tirar a vida de outrem também traz consequências negativas às vidas de quem cometeu tais crimes".