Por que o Espiritismo brasileiro não vibrou para deter a ascensão do fascismo?


QUE PÁTRIA DE EVANGELHO É ESSA? QUE ESPÍRITOS DE LUZ SÃO ESSES? QUE LÍDERES TEREMOS PARA O TAL "REINO DE LUZ"? ESTRANHO...

Estamos perto da tal "data-limite" e o Brasil vive a ascensão do fascismo.

Ele estava latente em atos isolados, crimes diversos como extermínios de homossexuais, cyberbullying, feminicídios, extermínios de gente pobre, pistolagem no campo etc.

Mas hoje a coisa se agravou e a sociedade que atuava de forma mais fragmentada parece que se articulou para tomar de vez o poder.

O que há de mais sórdido na sociedade, de cantores e atores medíocres e decadentes até feminicidas e psicopatas, passando por setores do latifúndio e do empresariado, estão "esperançosos" em ver seu ídolo político, o ex-capitão Jair Bolsonaro, governando o Brasil.

A situação tem enredo de obra kafkiana, pois Bolsonaro não tem motivos para se tornar um favorito para governar o país.

Até não tem. Afinal, suspeita-se que o economista Paulo Guedes e seus aliados esteja comprando os institutos de pesquisa para forjar um pretenso favoritismo do candidato do PSL.

Nas redes sociais, há uma campanha de assédio moral violento que força o apoio "quase unânime" a Jair Bolsonaro, na qual uma página feminina de oposição ao candidato chegou a ser invadida, a comunidade "Mulheres Contra Bolsonaro".

Meses atrás, quando ainda não era vice da chapa de Jair Bolsonaro, o general Antônio Hamilton Mourão afirmou, em entrevista, que se Lula fosse candidato e saísse vencedor, o militar armaria um golpe para tirá-lo do poder.

O grande absurdo é que o favorito oficial das pesquisas presidenciais é associado a pautas antipopulares. Desmonte do Estado, fim de direitos trabalhistas, precarização do emprego, fim dos debates nas escolas, venda de riquezas econômicas e naturais para empresas estrangeiras.

Outro absurdo: o projeto político de Jair Bolsonaro é identificado rigorosamente com o do impopular Michel Temer, e isso foi confirmado nas palavras de Paulo Guedes, apelidado de "posto Ipiranga".

Diante disso, pergunta-se: o que o Espiritismo brasileiro, em tese uma religião voltada ao amor, à solidariedade, à paz e ao progresso humano, fez para conter a ascensão do fascismo?

Nada.

A religião que se diz espiritualista sempre adotou uma moral conservadora e pouco se importava com a qualidade de vida numa encarnação com prazo estimado de 80 anos.

Pelo contrário, falava-se de vida futura dando o incerto como se fosse certo, sem se preocupar com o fato de que a encarnação posterior dificilmente mostrará as mesmas condições desperdiçadas na encarnação presente.

Para piorar as coisas, se observa um trabalho ideológico no qual Jair Bolsonaro é moldado como um pretenso humanista, depois de aparecer fazendo pose de atirador ou ensinando crianças a fazer o mesmo gesto.

Enquanto isso, por outro lado, surgem revelações nas quais três supostos médiuns, Francisco Cândido Xavier, o Chico Xavier, Divaldo Pereira Franco e João Teixeira de Faria, o João de Deus, defendem ideias e personalidades associadas ao conservadorismo ideológico.

No Pinga Fogo da TV Tupi, Chico Xavier defendeu abertamente a ditadura militar, quando ela estava na sua pior fase.

Ele pedia para "orarmos para os militares" que estavam fazendo do Brasil um "reino de amor".

Era 1971 e a ditadura militar estava na sua fase mais desumana. Que "reino de amor" ela estava fazendo do Brasil, à custa do sangue de muitos inocentes, é algo que não dá para entender.

Nessa época, o hoje ídolo de Jair Bolsonaro, o coronel Brilhante Ustra, não só ordenava as torturas como ele, sádico, participava das mesmas. Nos interrogatórios, ele era o mais cínico, fazendo plena violência psicológica com cada preso político.

Chico Xavier apoiava a ditadura e, no Pinga Fogo, ele esculhambou comunistas e movimentos sociais usando o mesmo discurso reacionário de 1964.

Só que, em 1971, parte da direita que pediu a ditadura militar se desiludiu com o regime. O maior apoiador do golpe militar, o jornalista e ex-governador da Guanabara, Carlos Lacerda, defendeu anos antes um movimento de redemocratização, a Frente Ampla, extinta por ordem ditatorial.

É lamentável que setores das esquerdas ainda prestem alguma consideração por Chico Xavier, que nunca sentiu a menor simpatia por movimentos progressistas de esquerda.

E é preocupante que o pensamento desejoso ainda faça os esquerdistas insistirem na sua ilusão, volta e meia sujando suas páginas com textos de Chico Xavier que mais parecem o AI-5 dissolvido em água com açúcar, apelando para as pessoas sofrerem caladas e nunca reclamarem.

A teimosia de um pensamento desejoso, que "concebe" Chico Xavier sob a imagem tão dócil quanto uma fada-madrinha, faz com que nossos progressistas de esquerda sempre adotem uma postura masoquista.

Acabam caindo em contradição consigo mesmos, porque muitos dos textos dos esquerdistas são justamente sobre reclamações sobre os abusos cometidos pela grande mídia.

Mexem sobretudo no tesouro do qual Chico Xavier é, ao mesmo tempo, protetor e protegido: a Rede Globo de Televisão, da qual o "médium" é visto como uma espécie de "padroeiro".

Chico talvez não gostasse de ver jornalistas de esquerda criticando sua querida Globo, preferindo que os profissionais de imprensa desse plano ideológico fizessem apenas críticas leves e positivas, sem questionar sua supremacia.

Pelo "médium", os jornalistas de esquerda deveriam ficar calados, aceitar a hegemonia da Globo, tratá-la como "emissora-irmã" e se solidarizar a ela, em vez de pensar em "ideias absurdas" como a regulação da mídia.

Pior é que tem esquerdista que acha um absurdo Chico Xavier ser ultraconservador. Deveria ver a entrevista do Pinga Fogo e prestar atenção nas ideias do "grandioso médium".

Se desapegando dos dribles praticados pelo pensamento desejoso à lógica do realismo desagradável, aprenderão que o "médium" foi uma figura ultraconservadora, até o fim.

Daí que o Espiritismo brasileiro criou um imaginário que propiciou o levante reacionário que temos, de uma minoria de sociopatas, especuladores financeiros, militares e magistrados ultraconservadores que, de repente, passaram a se achar "donos do Brasil".

E os nossos "espíritas" preocupados em coisas abstratas, vagas problemáticas sobre "egoísmo humano", "apego à matéria" e "revolta com as dificuldades da vida".

E tudo sempre sob o mesmo apelo: aos desafortunados da sorte, recomendava-se a "aceitação do sofrimento", de preferência com amor e paciência infinitas, esperando a desgraça ir embora não se sabe quando, mas, provavelmente, após a morte.

Em contrapartida, os desafortunados também deveriam ver, nos privilegiados abusivos e nos algozes, com olhos misericordiosos, se confirmando até com sua impunidade, sob o pretexto de que, num futuro distante, Deus acertasse as contas com os caloteiros morais da hora.

A moral do Espiritismo brasileiro sempre primou para a aceitação das desigualdades sociais e, quando muito, apenas com a aplicação da suposta caridade, o Assistencialismo (a "caridade" de baixos resultados e sem mudanças profundas nem definitivas).

Como definir "progressista" uma religião cuja "caridade" não pode mexer nas estruturas sociais dominantes?

Se percebermos bem, o Espiritismo brasileiro sempre se consentiu com os ventos políticos e sociais conservadores.

A religião que traiu Allan Kardec tinha que se sustentar com uma moral conservadora, trazida pela catolicização que reduziu o que se conhece no Brasil como Espiritismo em um engodo medieval.

E agora o Espiritismo brasileiro tem que assumir suas consequências, pois toda sua fantasia de "Brasil, Coração do Mundo, Pátria do Evangelho" encontrou sua tradução mais exata: "Brasil, acima de tudo, Deus acima de todos".

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